Claudia Schatz

Comprar legumes pré-cortados. Sim ou não?

Atualizado: 2 de set de 2022

Você vai ao mercado em um sábado pela tarde, louco pra voltar pra casa e poder continuar com a programação do final de semana. Na parte do hortifrúti, vê a sessão de alimentos pré-cortados e pensa: "por que não comprar os legumes já lavados e picados? Vou ganhar muito tempo durante a semana." Você coloca algumas bandejas no carrinho e segue pro próximo setor.

Já aconteceu isso com você? Desde cenouras, cogumelos, tempero verde picado até frutas. Comigo já, principalmente com a moranga que eu pensava "caramba, agora sim não preciso mais descascar, yuhu!"

A questão aqui não será a conveniência (sim, é mais fácil né?!), mas sim a qualidade e o efeito nutricional. Será que é o mesmo entre alimentos inteiros e pré-cortados? Vamos aos dados.

Onde tudo começa

Mas calma, quero ser específica aqui. Vamos começar falando em endotoxinas, que são componentes estruturais de bactérias gram-negativas, como a mais conhecida E.coli. Quando em alta concentração no nosso corpo elas iniciam um processo inflamatório, principalmente nos intestinos, no trato digestivo e urinário.

Na literatura científica, há uma teoria que procurava explicar como uma única refeição de salsicha e ovo poderia prejudicar o funcionamento da artéria poucas horas após o consumo. Talvez porque tal refeição cause inflamação ao induzir uma endotoxemia de baixo grau: endotoxinas na corrente sanguínea poucas horas após o consumo.

Temos, no nosso intestino, uma grande colônia de bactérias. Na verdade, temos mais bactérias pelo nosso corpo que células. E sim, dentre as bactérias, temos também essas gram-negativas, como endotoxinas. Mas além do que já temos, podemos estar colocando ainda mais dessas bactérias que causam inflamação para dentro do nosso corpo e da nossa corrente sanguínea, e isso através dos alimentos.

Certos alimentos têm cargas bacterianas mais altas, como o caso da carne moída. Já ouviu alguém dizendo "eu não compro carne moída porque ela tem mais bactérias que um pedaço inteiro"? E é verdade. Porém, mesmo assim as maiores fontes de endotoxinas são carnes em geral e laticínios. Isso, principalmente, devido a contaminação cruzada com fezes do próprio animal quando o trato digestivo é rompido ou da contaminação do ambiente físico (que pode ser mais comum que se imagina).

E se eu ferver ou fritar bem? Em um estudo, perceberam que há como matar facilmente qualquer bactéria se a carcaça é fervida por tempo suficiente, mas não as endotoxinas. E no momento que as endotoxinas estão no local, a carne pode ser armazenada até mesmo na geladeira, o crescimento bacteriano permanece.

Clau, mas minha alimentação é Plant-Based! Quero saber dos vegetais e legumes!

Ufa, fico muito feliz por você. Então não se preocupe com isso.

Vamos para os legumes pré-cortados.

Em outro estudo conduzido, os níveis mais baixos das endotoxinas foram encontrados em frutas e vegetais frescos, porém em alimentos inteiros.

As bactérias e organismos deteriorantes não conseguem penetrar pelas duras cascas naturais. Porém, quando abrimos os alimentos, essas bactérias conseguem ter acesso ao interior do fruto e em dias começam o processo de deterioração.

Basicamente, quando cortamos os alimentos, rompemos com a camada de proteção natural e diminuímos a resistência deles. Se picarmos uma cenoura e analisarmos, ela não terá níveis detectáveis de bactérias. Todavia, dia após dia e mesmo na geladeira, vemos o crescimento das bactérias. Calma, não tão acelerado como acontece com produtos de origem animal.

Aqui entra um estudo incrível: foram comparadas cebolas recém picadas com cebolas pré-picadas e refrigeradas por alguns dias. Essas pré-picadas foram picadas estando as cebolas em ótimo estado.

Cebolas agem no nosso corpo como potentes anti-inflamatórios, por isso do estudo ser tão incrível, pois o ponto principal é analisar se as cebolas pré-cortadas tem endotoxinas causadoras de inflamação.

O intuito do estudo era ver como as cebolas se comportariam dentro do nosso corpo, então elas foram consumidas por participantes do estudo.

3 horas após o consumo, a cebola fresca causou diminuições significativas em vários marcadores de inflamação (como falei acima, um benefício natural da cebola, assim como de outras frutas e vegetais).

** Os grupos foram medidos antes do consumo de cebolas e depois, para saber quanto de inflamação eles tinham quando iniciaram o estudo e depois do consumo.

Todavia, esse resultado não foi observado no grupo que comeu a mesma quantidade exata de cebolas pré-picadas. Não houve a mesma redução na inflamação como no primeiro grupo, mas também não houve aumento da inflamação.

Ou seja, não é que as cebolas pré-cortadas tenham causado mais inflamação (como em estudos com carne, leite e ovos), os níveis de inflamação permaneceram estáveis.

Conclusão: consumir verduras e legumes pré-cortados em vez de alimentos inteiros está associado a um aumento da exposição de endotoxinas orais. Porém, frutas e verduras tem efeitos anti-inflamatórios tão potentes que as endotoxinas acabam cancelando esse poder, mas não causando mais inflamações no corpo.

Definitivamente, ainda é melhor comer vegetais pré-picados do que não comer vegetais devido a todos os demais nutrientes, mas cortar os seus próprios pode ser mais saudável.

Referências:

Vogel RA, Corretti MC, Plotnick GD. Effect of a single high-fat meal on endothelial function in healthy subjects. Am J Cardiol. 1997;79(3):350-4.

Herieka M, Faraj TA, Erridge C. Reduced dietary intake of pro-inflammatory Toll-like receptor stimulants favourably modifies markers of cardiometabolic risk in healthy men. Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2016;26(3):194-200.

Cho B, Kim MS, Chao K, Lawrence K, Park B, Kim K. Detection of fecal residue on poultry carcasses by laser-induced fluorescence imaging. J Food Sci. 2009;74(3):E154-9.

Tournas VH. Spoilage of vegetable crops by bacteria and fungi and related health hazards. Crit Rev Microbiol. 2005;31(1):33-44.

Erridge C. Stimulants of Toll-like receptor (TLR)-2 and TLR-4 are abundant in certain minimally-processed vegetables. Food Chem Toxicol. 2011;49(6):1464-7.